Alegoria da “Fundação de Belém”

Um olhar detalhado sobre a tela “A Fundação da Cidade de Nossa Senhora de Belém do Pará”(1908)-óleo sobre tela- 226cm x 510cm, de autoria do pintor paraense Theodoro Braga, realizada sob encomenda do Intendente Antonio José de Lemos.

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Tal pintura, configura-se em uma das obras mais destacadas do acervo do Museu de Arte de Belém, possuindo relevância artística e sócio-cultural no contexto local e nacional, tornando-se uma significativa fonte de informação e pesquisa, no uso constante como referência iconográfica em livros escolares, graduações acadêmicas e como patrimônio da cidade em publicações de enfoque turístico, que em sentido amplo sinaliza para as identidades locais e, por conseguinte nacionais. Considerada ainda, como a Certidão de Nascimento da cidade de Belém.

A pintura alegoriza um fato histórico de 1616, narrando de forma original e maestria pictórica, em três cenas distintas, a fundação da atual cidade de Belém do Pará. Uma representação da consolidação da colonização portuguesa na Amazônia, com os principais atores do acontecimento, os agentes coloniais, militares, comerciantes, religiosos e os indígenas, estes, relegados sempre à um segundo plano na historiografia oficial. Estamos diante de uma pintura de traçado acadêmico que possui interlocução com obras emblemáticas de notórios artistas nacionais da época, que representaram acontecimentos marcantes da formação do país, com características envolvendo temática histórica, religião,paisagem e o indianismo, símbolos identificadores da nação. Sendo um diferencial nesta pintura de gênero histórico, a grandiosidade da exuberante natureza de característica local, destacada em primeiro plano em sua vegetação de vários tons, o imenso amarelo-barrento das águas da baía do Guajará e o céu plúmbeo de nuvens carregadas da foz do Amazonas.

Na primeira cena da pintura, à direita, vê-se ainda distante o aparecimento de três embarcações trazendo os colonizadores. Essa chegada é observada com atenção e apreensão, pelos nativos Tupinambá, retratados na cena às margens das águas,  montando posto de espreita num pequeno igarapé que desaguava na baía do Guajará e que mais tarde viria a ser chamado de Ver-o-Peso. Esse recorte da pintura não remete à um encontro com conquistadores europeus desconhecidos e sim à um reencontro. Os Tupinambá já conheciam os portugueses de longa data, em lutas no Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco, Maranhão e agora,os viam chegar, nas terras do Pará.Observa-se também neste enquadramento inicial, a característica marcante presente em toda a grande tela , o destaque para a natureza amazônica, onde pode-se observar , os aturiás, vegetação regional de área de mangue.

Em primeiro plano, ao centro da tela, é destacada a figura do fundador Francisco Caldeira Castelo Branco, cercado por seu estado-maior, os comandantes das embarcações, oficiais e a presença de um clérigo. Segundo o autor, tal cena representa a preparação da viagem de Pedro Teixeira ao Maranhão, “a fim de levar a nova da fundação da cidade de Belém”. A representação de tais personagens,  apresenta uma visão particular de Theodoro , que se vê presente também, na cena seguinte mostrando a construção do Forte do Presépio, onde ele redesenha os fatos originais, os dotando da grandiosidade e eloqüência necessárias à alegoria para a posteridade da fundação da capital da borracha.

Theodoro contraria os historiadores de sua época, imprimindo altivez às imagens dos homens que vinham na frota de Castelo Branco,   afirmando que  “os expedicionários  não vinham nem na miséria, a ponto de pedirem o que comer aos índios, nem desprovidos de tudo, como é corrente, a ponto de serem ajudados por piedade pelos caboclos do Guajará na construção do Forte e habitações”. Tal cena é desenrolada sob à sombra de grandes árvores do herbário amazônico que dominam e dividem a pintura em dois momentos distintos no tempo, a chegada e a consolidação do domínio português.  

Em primeiro plano, ao centro da tela, é destacada a figura do fundador Francisco Caldeira Castelo Branco, cercado por seu estado-maior, os comandantes das embarcações, oficiais e a presença de um clérigo. Segundo o autor, tal cena representa a preparação da viagem de Pedro Teixeira ao Maranhão, “a fim de levar a nova da fundação da cidade de Belém”. A representação de tais personagens,  apresenta uma visão particular de Theodoro , que se vê presente também, na cena seguinte mostrando a construção do Forte do Presépio, onde ele redesenha os fatos originais, os dotando da grandiosidade e eloqüência necessárias à alegoria para a posteridade da fundação da capital da borracha.

Theodoro contraria os historiadores de sua época, imprimindo altivez às imagens dos homens que vinham na frota de Castelo Branco,   afirmando que  “os expedicionários  não vinham nem na miséria, a ponto de pedirem o que comer aos índios, nem desprovidos de tudo, como é corrente, a ponto de serem ajudados por piedade pelos caboclos do Guajará na construção do Forte e habitações”. Tal cena é desenrolada sob à sombra de grandes árvores do herbário amazônico que dominam e dividem a pintura em dois momentos distintos no tempo, a chegada e a consolidação do domínio português.  

Na terceira cena da grande tela, surge uma dinâmica e opulenta construção de uma fortificação, em um lugar de altura apropriada para defesa , que viria a ser o Forte do Presépio, presente na cidade de Belém até os dias atuais, hoje resignificado como o Museu do Encontro  . Em tal empreitada é possível ver trabalhadores portugueses e a presença de indígenas cativos, povos originários não mais livres e senhores de suas terras, sendo coadjuvantes de conquistas e domínio europeu. Nesta cena, tal qual no recorte central da obra, Theodoro defende interpretação divergente dos demais historiadores, que sinalizavam tal edificação ter sido erguida inicialmente em palha.  Através de seus pincéis, ele a edifica em pedra. Tal esforço narrativo, justifica-se para se construir a certidão de nascimenro de uma Belém, que em 1908, era a opulenta capital da borracha e atender assim, as expectativas de quem encomendou a obra, o Intendente Antonio Lemos, que certamente não aprovou um esboço original, onde o Forte do Presépio aparece como uma simples paliçada com cercado em madeira. Da paleta de Theodoro, vemos uma pequenina igreja no interior de um forte de pedra, consagrada à Nossa Senhora de Belém, levantada em taipa, coberta de palhas, ao fundo as modestas habitações dos novos colonos e o Forte com sua frente de cestões entre os quais, peças de artilharia já estão assentadas e um muro de arrimo é construído.

A flora : o herbário amazônico

A flora : o herbário amazônico

A vegetação que orna a vista foi pensada como espécimes de um herbário característico da flora equatorial do Brasil. Ao centro, duas árvores com fortes conotações simbólicas para a Amazônia: a seringueira, responsável pelo triunfo do progresso contemporâneo do artista, via exploração do látex, e a imbaubeira, típica de floresta secundária e, por isso mesmo, representando o trabalho de colonização da região. Enrolada em cipós, ao centro da tela uma grande árvore uma espécie de síntese visual da flora da Amazônia, exibindo “a majestade grandiosa de nossas florestas tropicais”. Houve lugar ainda para a palmeira do açaí, que produz o fruto de onde se extrai a bebida mais popular entre os paraenses e à beira d’água , o mururé e o aningal das redondezas de Belém, concebidos como parte ornamental da natureza amazônica transporta para um retrato da história. E o cenário foi composto por analogia às características ecológicas do litoral lamacento que circundava o Guajará, em cuja vegetação de mangue vicejavam os aturiás, vistos no quadro como uma espécie de símbolo da vegetação amazônica. Ao fundo, no horizonte, aparece a “longa fita verdejante da Ilha das Onças, intacta e fronteiriça ao desembarcadouro dos portugueses.(texto de Aldrin Moura de Figueiredo)

A moldura

A moldura

Theodoro Braga construiu também de forma eloqüente, a moldura da grande tela, para que a mesma traduzisse os elementos identitários presentes em sua pintura . Em uma estrutura em ferro, madeira e estuque com douramento final, o artista esculpiu e modelou elementos característicos da vegetação amazônica, como aturiás e folhas de aninga , associados à adornos do classicismo, em seus medalhões e ornatos, Ao centro, no alto, ladeando o Brasão de Armas da Cidade de Belém, esculpiu palmas de açaí . Com isso, o artista imprimiu na moldura da tela, a alegoria do encontro de culturas

Theodoro Braga

Theodoro José da Silva Braga (Belém, Pará, 1872 – São Paulo, São Paulo, 1953). Pintor, decorador, professor, caricaturista, historiador, crítico de arte. Forma-se pela Faculdade de Direito do Recife em 1893. Ao mesmo tempo, inicia estudos em arte com o pintor paisagista Jerônimo José Telles Jr. (1851-1914). Produz caricaturas para a imprensa da região.

Em 1894, transfere-se para o Rio de Janeiro e faz caricaturas para o Jornal do Commercio e a revista Vera Cruz. Matricula-se na Escola Nacional de Belas Artes (Enba), e tem como professores Belmiro de Almeida (1858-1935) e Zeferino da Costa (1840-1915). Recebe o Prêmio de Viagem em 1899, estuda na Academia Julian em Paris entre 1900 e 1905, com os pintores Jean P. Laurens (1838-1921) e Benjamin J. Constant (1845-1902). Volta-se para a pintura histórica e artes decorativas. Regressa ao Rio em 1905, e realiza a primeira exposição individual, exibida, a seguir, em Recife e Belém. De volta ao Pará, cultiva o interesse por história e ciências naturais. Dedica-se ao estudo de motivos decorativos indígenas e da flora e fauna locais.

Por encomenda do município de Belém, pinta A Fundação da Cidade de Nossa Senhora de Belém (1908). Em busca de fontes para a realização da obra, viaja a Portugal. Redige e ilustra contos folclóricos para crianças, publicados em 1911. Para o tricentenário de fundação de Belém, publica Apostilas de História do Pará (1916), distribuída nas escolas e reeditada pelo Conselho de Cultura em comemoração ao centenário de seu nascimento. Publica ainda A Arte no Pará, 1888-1918: Retrospecto Histórico dos Últimos Trinta Anos (1918). Dirige o Instituto de Formação Profissional Lauro Sodré e promove exposições de trabalhos produzidos por estudantes entre 1908 e 1920.

Transfere-se para o Rio de Janeiro em 1921, leciona na Enba e dirige interinamente o Instituto de Formação Profissional João Alfredo. Fixa residência em São Paulo e, em 1925, torna-se professor do Instituto de Engenharia Mackenzie e diretor da Escola de Belas Artes. Nos anos 1930, em Perdizes, São Paulo, constrói para si uma casa com motivos marajoaras.

Realiza na Escola Normal do Brás a conferência “O Ensino do Desenho em Nossas Escolas”transmitida por rádio. Publica artigos sobre o ensino do desenho no Rio de Janeiro a partir de 1921. Faz experiências inovadoras no ensino artístico, como a adoção de modelos baseados na natureza local, ao lecionar na Escola Brasileira de Arte. Publica Desenho Linear Geométrico (1951) e Artistas Pintores no Brasil (1942), que reúne referências sobre centenas de artistas.

O Museu de Arte de Belém, possui em seu acervo quatro obras de Theodoro Braga a saber:

“Aparição a São Lucas”, 1903, óleo sobre tela, 131,5cm x 90,9cm

“Captação d’Água”, 1905, óleo sobre tela, 44 x 93cm

“Fundação da Cidade de Belém”,1908, óleo sobre tela, 226cm x 510cm

 “Retrato do Intendente Antonio Martins Pinheiro”,1917, óleo sobre tela, 73,5 x 59cm

Confira as suas obras que fazem parte do acervo do Mabe

MABE

arts

Alegoria da “Fundação de Belém”

Idealização/Pequisa e Roteiro Virtual – Nina Matos

Textos – Nina Matos e Aldrin Figueiredo

Fotografia: Janduari Simões

Montagem – Mariano Siqueira

Bibliografia: Catálogo da Exposição “ A Fundação da Cidade de Belém” – Museu de Arte de Belém- Textos de Lúcia Hussak Van Velthem e Aldrin Moura de Figueiredo – 2004 – Gráfica Santa Marta.

Trilha: The Thought of You – TrackTribe (Youtube Studio Audios)